Penfigóide Cicatricial ou das Membranas Mucosas
É uma bulose crônica que acomete preferencialmente as mucosas oral e ocular, deixando cicatriz permanente. A pele é pouco atingida.
Epidemiologia: Doença rara, com incidência de 1/milhão/ano onde as mulheres são mais afetadas que os homens (2:1). Ocorre predominância pela idade mais avançada (60-80 anos), mas pode afetar crianças e adolescentes. Normalmente não há associação com malignidade, mas um subtipo que apresenta auto-anticorpos contra a laminina 5 (laminina 332na nova nomenclatura), também conhecido como anti-epiligrina CP, parece mostrar um risco relativo maior para câncer.
Etiopatogenia: Estudos ultra-estruturais demonstram a formação da bolha na porção inferior da lâmina lúcida. Há associação com doenças auto-imunes. O HLA-DQ7 (DQB1*0301) está presente em todos os portadores do penfigóide cicatricial. A patogênese é similar à do penfigóide bolhoso, embora os auto-anticorpos IgG, e mais raramente, IgA e IgE pareçam estar mais associados com os filamentos de ancoragem (laminina 5) do que com os hemidesmossomos. A maioria dos pacientes dirigem os auto-anticorpos para os antígenos do penfigóide bolhoso BP230, BP180 e colágeno VII. Mas, o BP180 é considerado o maior sítio de autoreatividade no penfígóide oral. Todos os componentes da zona da membrana basal parecem estar envolvidos. A razão para as cicatrizes não é clara, embora achados sugerem que a interleucina 13 (IL-13) esteja envolvida na fibrose conjuntival do penfigóide cicatricial e que ela tenha efeitos tanto pró-fibrótico como pró-inflamatório sobre os fibroblastos conjuntivais humanos.
Manifestações clínicas: Na maioria dos indivíduos ocorrem as lesões orais, sem manifestações cutâneas. A boca está envolvida em 85% dos casos. A gengivite descamativa é a mais freqüente manifestação. Podem ser visualizadas na mucosa oral erosões e mais raramente bolhas. O vermelhão dos lábios é poupado ao contrário do pênfigo. O envolvimento ocular (65%) é característico. Inicialmente há conjuntivite, que progride insidiosamente, com obstrução do saco conjuntival, duto lacrimal e posterior cegueira. Nos estágios finais a córnea torna-se seca e opaca – olho de estátua. Outras mucosas podem ser envolvidas como a do nariz, faringe, esôfago, laringe, vagina, pênis e reto. Envolvimento esofagiano com fibrose e estenose pode levar a disfagia, aspiração e pneumonia.
As lesões cutâneas podem ocorrer com pouca freqüência (25-30%), em geral, perto de orifícios e são caracterizadas por bolhas ou vesículas tensas, às vezes sobre base eritematosa ou urticariana, usualmente limitadas. Cicatrizes atróficas podem surgir ou não.
Uma forma de penfigóide cicatricial, descrita inicialmente como puramente cutânea é o tipo Brunsting-Perry (1957) que é observado em indivíduos idosos e caracterizado por uma ou várias placas eritematosas com bolhas localizadas na cabeça e pescoço. Alguns pacientes podem desenvolver lesões de mucosa. À imunofluorescência direta encontramos semelhança com o penfigóide bolhoso, ou seja, IgG e/ou C3 na membrana basal com IMF indireta inicialmente negativa. A erupção tende a ser crônica e sem remissões.
Diagnóstico: Histopatologia. Nas formas iniciais, da pele ou mucosa, encontramos vesículas subepidérmicas com denso infiltrado inflamatório em derme ou submucosa contendo predominantemente linfócitos, histiócitos e plasmócitos e mais raramente eosinófilos e neutrófilos. Nas lesões mais tardias, proliferação de fibroblastos leva à fibrose, característica distintiva do penfigóide cicatricial.
A imunofluorescência direta lesional e perilesional da pele ou membrana mucosa mostra deposição linear de C e IgG e menos freqüentemente IgA e IgM. Na imunofluorescência indireta auto-anticorpos IgG e IgA são encontrados circulando em torno de 20-30% dos pacientes pelas técnicas de rotina e em cerca de 82% pela técnica de salt-split.
Há uma variação nos padrões de imunofluorescência explicada pelos múltiplos antígenos envolvidos: BP180, BP230, α6β4 integrina, laminina 5 e colágeno VII.
Tratamento: Em formas localizadas pode ser usada a terapêutica tópica. Debridamento da área lesada da mucosa oral, uso de peróxido de hidrogênio e de lágrimas artificiais. O uso de flucinonida gel e triancinolona em orobase ou na forma injetável (5-10mg/ml) a cada 2-4 semanas em lesões de pele, cavidade oral, nariz, genitália e região anal, tem sido de valia.
Na terapia sistêmica a dapsona (75-200mg/dia) é a droga de primeira escolha, controlando a inflamação. Os corticóides (prednisona 20-80mg/dia), dependendo da severidade do caso em 1 ou 2 vezes ao dia, ou em forma de pulsos. Os agentes imunossupressores principalmente ciclofosfamida e azatioprina na dose de 2mg/Kg/dia podem ser utilizados com resposta em 8-12 semanas. Tratamento cirúrgico para resolução das estenoses das vias aéreas e do esôfago.